domingo, maio 21, 2006

Avaliação para identificação das Necessidades Educacionais Especiais

A função da avaliação que a torna uma das mais importantes práticas para a elaboração do projeto político-pedagógico de qualquer escola é a de transformação.

Atualmente, propõe-se avaliar a avaliação como princípio, tendo como finalidades e objetivos promover mudanças, para melhor, seja:

- nas atitudes dos educadores frente à facilidade em aprender ou em relação às dificuldades de muitos alunos;

- nos processos utilizados para a construção de conhecimentos ou nas atividades desenvolvidas, buscando-se alternativas diversificadas, sempre visando a atingir todos os níveis de concretização da intencionalidade educativa.

Em outras palavras, a avaliação, definitivamente, há que servir para auxiliar e orientar os educadores na tomada de decisões que contribuam para o aprimoramento de respostas adequadas às necessidades dos alunos.

Tendo como finalidade melhorar o que precisa ser mudado, fazem-se necessárias e urgentes algumas providências como:

• a ressignificação da função da avaliação, pelo professor e pelos demais avaliadores;

• a participação do aprendiz que, em vez do medo dos resultados, terá interesse em auto-avaliar-se, bem como em colaborar no processo avaliativo, na certeza de que ele contribuirá para seu progresso;

• a participação da família;

• a escolha cuidadosa de procedimentos e instrumentos;

• se for o caso de se usarem indicadores, que sirvam como pistas, como sinalizadores e não como itens de um instrumento no qual se assinala a presença ou a ausência do fato ou fenômeno observado ou, o que seria pior, para atribuir-lhes pontos;

• a utilização das análises em ações de melhoria do que tiver sido avaliado.

Segundo as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica “Para a identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos e a tomada de decisões quanto ao atendimento necessário, a escola deve realizar, com assessoramento técnico, avaliação do aluno no processo de ensino e de aprendizagem, contando, para tal com:

I- a experiência de seu corpo docente, diretores, coordenadores, orientadores e supervisores educacionais;

II- o setor responsável pela educação especial do respectivo sistema;


III- a colaboração da família e a cooperação dos serviços de saúde, Assistência Social, Trabalho, Justiça e Esporte, bem como do Ministério Público, quando necessário (Art.6°).


Na fase de transição entre os procedimentos de avaliação ainda em uso pela equipe da educação especial e a adoção, na escola, do “modelo proposto”, a equipe de avaliadores da educação especial trabalha articulada com a coordenação pedagógica das escolas. À medida em que estas puderem assumir a identificação das necessidades educacionais especiais dos alunos – com a participação efetiva dos seus professores -, a equipe de avaliadores da educação especial passará a contribuir, como assessoramento especializado.

Espera-se que, após análises e reflexões críticas mude-se o enfoque e revejam-se as práticas avaliativas de modo a:

(a) substituir os instrumentos referidos a normas por outros que permitam analisar as variáveis implícitas no contexto onde o aprendiz está;

(b) valorizar a contribuição dos professores, preparando-os para avaliar as necessidades especiais de seus alunos em relação às demandas e aos apoios que lhes oferece;

(c) utilizar o diálogo e as observações como importantes ferramentas de trabalho;

(d) compartilhar a análise dos dados obtidos, relativizando-os com os múltiplos fatores que interferem na aprendizagem

(e) envolver o próprio avaliado e sua família e

(f) se necessário para a satisfação das necessidades educacionais do avaliado, complementar as informações, com a participação de outros profissionais.

O maior contingente de alunos para a avaliação diagnóstica vem do ensino comum, geralmente porque há suspeita de alguma deficiência, de distúrbios de aprendizagem, ou porque incomodam, pelo comportamento.

Embora possa vir dos pais, ou de outras pessoas que convivem com o aluno, a decisão de seu encaminhamento para a avaliação, tem sido, usualmente, tomada pelo professor da classe comum, que busca uma assistência adicional, oferecida pelos especialistas da educação especial.

Ysseldyke menciona 5 (cinco) tipos de decisão que antecedem a avaliação realizada pelas equipes de diagnóstico:

- encaminhamento para tratamento,
- triagem,
- classificação,
- planejamento educacional e
- análise do progresso do aluno.

Os 3 (três) primeiros tipos são os mais comuns, sendo que a análise do progresso do aluno é, de todos, o que menos ocorre.

Encaminha-se para a avaliação em busca de tratamento para o aluno pois, ainda se supõe que haja alguma patologia que explique suas dificuldades. Assim sendo é nele que está o “defeito” que precisa ser conhecido e tratado. O aluno com “defeito” fica como o responsável solitário por seu fracasso.

As decisões de triagem estão relacionadas com as de encaminhamento. Como durante décadas a educação especial foi considerada como compensatória e como espaço de pedagogia terapêutica, o encaminhamento para a avaliação tinha como expectativa o tratamento em escolas ou classes especiais.

Ao serem avaliados, tem-se considerado a maneira como os sujeitos executam as tarefas padronizadas nos testes que lhes são aplicados. Espera-se que o avaliado forneça todas as informações que viabilizem ao avaliador compreender seu desempenho tanto nas tarefas, quanto no seu dia-a-dia. Espera-se, também, que as informações obtidas permitam decidir se é ou não é caso para classes ou escolas especiais. Ou, na melhor das hipóteses, para as classes comuns com apoio das salas de recursos.

Quanto às duas outras decisões - de planejamento educacional (com as adequações necessárias) e progresso dos alunos (sob o enfoque global de seu desenvolvimento)- são as que, hoje, devem nortear as práticas avaliativas escolares em geral e, particularmente, na educação especial.

Conhecer, compreensivamente, as características dos avaliados irá contribuir para que as decisões acerca do planejamento educacional incluam todas as providências que permitam a remoção de barreiras para a aprendizagem e para a participação. Finalmente, os dados do processo de avaliação servirão para acompanhar os progressos dos alunos, comparando-o com ele mesmo.

Na Resolução CNE/CEB N°2 de 11 de setembro de 2001, no Art.5, se consideram-se como educandos com necessidades especiais todos os que, durante o processo educacional apresentarem dificuldades de aprendizagem vinculadas, ou não, a uma causa orgânica específica; os que apresentam dificuldades de comunicação e sinalização diferenciadas dos demais alunos e os de altas habilidades .

As necessidades educacionais (referentes à educação escolar) podem se manifestar como exigências de mediação nos aspectos cognitivos, lingüísticos, afetivos, motores, psicomotores, práxicos e sociais, para o desenvolvimento de competências e de habilidades, inclusive nas condutas adaptativas, estas mais concernentes aos alunos com deficiências.

Segundo Perrenoud, a competência traduz-se por saber e fazer, envolvendo “diversos esquemas de percepção, pensamento, avaliação e ação que suportam inferências, antecipações, transposições analógicas ...”. Ainda com esse autor, as habilidades fazem parte das competências.

Em relação a estas, do documento intitulado Matrizes Curriculares de Referência para o Sistema de Avaliação de Educação Básica –SAEB- (1999) constam inúmeras competências cognitivas agrupadas em “três níveis distintos de ações e operações mentais que se diferenciam pela qualidade das relações estabelecidas entre o sujeito e o objeto do conhecimento”.

Os níveis são: o básico, o operacional e o global. No nível básico, encontram-se as ações mentais que possibilitam a apreensão das características e propriedades dos objetos, propiciando a construção de conceitos. Citam-se como exemplos de competências nesse nível: observar para levantar dados; identificar, reconhecer, indicar, apontar, dentre diversos objetos, aquele que corresponde a uma descrição; localizar um objeto descrevendo sua posição.

No nível operacional, as competências traduzem-se por ações mentais coordenadas que pressupõem o estabelecimento de relações entre os objetos, possibilitando: classificar, organizando objetos de acordo com um critério, incluindo classes e subclasses; seriar, organizando objetos de acordo com suas semelhanças ou diferenças; fazer antecipações sobre o resultado de experiências; justificar acontecimentos.

No nível global, encontram-se ações e operações mentais mais complexas que exigem a aplicação dos conhecimentos a situações diferentes e à resolução de problemas inéditos. As seguintes competências, à guisa de exemplos, inserem-se no nível global: analisar determinados objetos com base em princípios, valores; explicar causas e efeitos de determinados fatos e fenômenos; fazer generalizações a partir de leis ou de relações descobertas ou estabelecidas em situações diferentes.

Com propriedade Hadji aponta quatro pistas para colocar a avaliação a serviço da ação educativa. Podem ser consideradas como caminhos a serem percorridos pelas equipes de avaliadores que trabalhem nas escolas, ainda que estejam nelas durante alguns períodos, na impossibilidade de pertencerem a seus quadros, como seria o ideal.

1- Um dos caminhos é refletir sobre os objetivos da prática avaliativa, assumindo-se que está a serviço de ações que levem à melhoria, qualquer que seja o sujeito ou o objeto avaliado. Neste percurso, a equipe pedagógica da escola exerce papel destacado. Nela, o professor é o principal autor da prática pedagógica em sala de aula porque é o que mais convive com o aluno.

2- Outra pista é referente às modalidades da prática avaliativa. A criatividade, o bom senso e a experiência do professor são altamente significativas e, muitas vezes, seus relatórios são tão esclarecedores que dispensam-se instrumentos a serem preenchidos e, depois, examinados por outras pessoas.

3- As condições técnicas de avaliação é outra das pistas apresentadas por Hadji. Relaciona-se com as demais, particularmente com as modalidades da prática avaliativa. E, sob o enfoque técnico, o caminho a ser percorrido deve conduzir à remoção das barreiras ainda existentes quanto ao uso de técnicas padronizadas, normativas ou referidas a critérios.

4- Finalmente, um outro caminho é o da deontologia do trabalho dos avaliadores, isto é, a preocupação com os princípios éticos que devem presidir qualquer atividade, em especial aquelas que ‘desvendam’ situações e condições, como é o caso da avaliação para a identificação das necessidades educacionais de alunos, escolas e famílias.

Ainda com o objetivo de apontar caminhos sugere-se:

Nas escolas: que a avaliação seja processo contínuo e compartilhado, reservando-se espaços constantes para que os professores se encontrem, em relações dialógicas, para avaliar e aprimorar suas práticas, para analisar as necessidades educacionais especiais de alunos, trocando sugestões e buscando alternativas para o enfrentamento das dificuldades existentes.

Nos órgãos centrais, implementadores de políticas de educação inclusiva: que se possibilite a ressignificação do papel e das práticas avaliativas em uso pelas equipes de diagnóstico da educação especial, levando-as a trabalhar nas escolas onde, juntamente com os professores e a equipe técnica pedagógica, possam extrair dados, analisá-los em conjunto, e participar do processo decisório quanto às estratégias a serem implementadas para resolverem problemas.

No caso de secretarias de educação dos estados nos quais o número de municípios é muito grande e não se dispõe de equipe técnica de diagnóstico ou, se existente, não conseguiria atender a toda a demanda, sugere-se que as equipes pedagógicas da escolas sejam estimuladas e adquiram competência técnica para realizar a avaliação, com vistas, sempre, à melhoria da qualidade da resposta educativa.

TEXTO-BASE
Avaliação para identificação das necessidades educacionais especiais / Coordenação geral:
SEESP/MEC ; elaboração: Rosita Edler Carvalho. – Brasília : Ministério da Educação,
Secretaria de Educação Especial, 2005

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