segunda-feira, janeiro 14, 2013

A Educação do autista

"São as caracterís­ticas de cada criança e de cada escola que definirão o sucesso do autista, e isso evidentemen­te não pode ser definido em lei, mas pelo bom senso", afirma jornal

Fonte: O Estado de S.Paulo (SP)

A presidente Dilma Rousseff sancio­nou lei que cria a Política de Prote­ção dos Direitos de Pessoa com Transtorno do Espectro Autis­ta. Nela qualifica-se o autista como "pessoa com deficiên­cia", garantindo-lhe uma série de direitos. Um deles, previsto no artigo 7.º, diz que "o gestor Escolar ou a autoridade compe­tente" que recusar a matrícula de Aluno com autismo será pu­nido com multa de até 20 salá­rios mínimos e, em caso de reincidência, perderá o cargo. Isso se aplica mesmo às esco­las particulares, que, como en­tidades privadas, deveriam ter o direito de determinar quem pode e quem não pode freqüen­tar suas aulas. Com a agravan­te de que a criminalização de quem se recusa a matricular um Aluno com autismo pressu­põe que todas as Escolas já de­veriam estar preparadas para essa inclusão, e que a rejeição significa simplesmente "pre­conceito" contra a pessoa com deficiência. Exageros assim desfiguram uma lei cujo propó­sito é nobre.

O autismo é uma deficiência de comunicação e de interação social, cuja principal manifesta­ção é a incapacidade do indiví­duo de estabelecer relações com os outros. O autista apre­senta padrões repetitivos de comportamento e interesses restritos. Por esse motivo, a in­clusão dos Alunos com autis­mo nas Escolas regulares, sem que haja uma adaptação da ins­tituição, pode gerar efeito oposto ao pretendido. Em lu­gar de combater o preconcei­to, a inclusão pode acabar dan­do espaço a manifestações de estranhamento por parte dos colegas diante do comportamento do autista, o que, não ra­ro, pode derivar para a violência. Logo, se o que se pretende é que o autista possa se desen­volver entre pessoas "nor­mais", é preciso que haja, an­tes, a formulação de progra­mas que envolvam professo­res, pais e Alunos.

Nem assim, porém, há certe­za de que a inclusão funcione. Especialistas argumentam que, ao simplesmente desco­nhecer as diferenças entre o au­tista e os Alunos "normais", a legislação pode acabar desres­peitando a própria identidade do estudante com deficiência - em lugar de ser educado como ele é, o autista será apenas "normalizado". A inclusão, pa­ra ser realmente eficiente e res­ponsável, deve ser antecedida por uma revisão curricular e uma adaptação pedagógica e espacial tão amplas e custosas que poucas entidades privadas teriam condições, ou interes­se, de bancar. Assim, para que a lei recém-aprovada fizesse sentido, ela deveria mencionar que a obrigação de promover a inclusão cabe à rede pública.

A Educação de autistas é um imenso desafio. Não existe a possibilidade de homogenei­zar o Ensino, como se faz na re­de regular, pois cada estudante nessas condições reage de ma­neira diferente - há crianças em estágio tão avançado de au­tismo que não são capazes de acompanhar nem o chamado Ensino "especial". Por esse mo­tivo, não se pode, de antemão, assegurar que o desenvolvi­mento de uma criança com au­tismo será melhor na rede re­gular do que na rede especial. Ademais, a inclusão não é a úni­ca forma de educar autistas, ra­zão pela qual a decisão sobre o assunto não pode levar em con­ta apenas o Aluno - deve-se con­siderar também sua família e a própria Escola. São as caracterís­ticas de cada criança e de cada Escola que definirão o sucesso do autista, e isso evidentemen­te não pode ser definido em lei, mas pelo bom senso.

O tema é delicado, pois envol­ve a crescente mobilização da sociedade para que as pessoas com deficiência possam exer­cer sua cidadania, algo que co­meça pelo direito à Educação. A maioria das "Escolas especiais", que deveriam servir a esse pro­pósito, não cumprem funções educacionais, mas apenas tera­pêuticas, nem são reconhecidas como Escolas propriamente di­tas - logo, seus estudantes tam­bém não são vistos como tais. É preciso mudar esse quadro, mas não se pode, em nome des­se ideal, atropelar os direitos de terceiros nem legislar ignoran­do o fato de que a maior parte do sistema educacional regular, cujo despreparo mesmo para os Alunos considerados "normais" é gritante, ainda está muito lon­ge de poder oferecer aos Alunos com autismo a assistência que eles necessitam.

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